domingo, 14 de janeiro de 2018

Ignoto


Sombra desconhecida que ronda.
Bandolim ecoando ao longe,
como seresta que caminha 
em estrada de barro.

Bocejo andando à toa pela casa.
Barulhos e sussurros já tão conhecidos,
sobreaviso.
Chuva no barro descampado.
Mar que jaz morto,
nem mesmo ondas a distrair,
nem mais suspense num porvir.
Sem dolência ou desgosto. Ignoto.
(Taciana Valença)

sábado, 13 de janeiro de 2018

EM NOME DE UMA LEVEZA




Caso a leveza permita,
salte em solo de cristal,
releve o tempo e as mentiras,
tranque em cofre seguro toda a ira.

Caso permita tal leveza,
ande sobre as águas do Capibaribe,
fale de amor e das afiadas dores
ao pé d'ouvido do maior tigre.

E então permita-se flutuar,
acima do mal que a nada convém,
olhando de cima o que se arrasta
em falso nome do bem.

Se puder ir além abra a asas,
mesmo que seja a da imaginação,
voe para cima das nuvens mais largas,
repousando em travesseiros de algodão.

(Taciana Valença)

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

MUNDO HERMÉTICO



Então aquela coisa clariciana volta e invade,

novo caos na pseuda ordem.
Portas abertas ao vazio.
A falta que faz a mochila nas costas,
a buscar respostas nesse caminho sem fim.
Ceder às ordens rodando em círculos,
olhos vendados a um mundo vendido.
O frio na barriga, a dormência, 
resposta a uma demência generalizada,
aos ritos proféticos de um mundo hermético,
num disparo sem volta.

Taciana Valença

segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Das cores e janelas


Verdes, vermelhas,
amarelas, azuis.
Simples assim,
coloridas como a vida.
Fascinam os olhos, 
enchem de emoção.
Pulsa o sangue
em vermelho coração. 
Vai da lua,
vai do bicho que der,
de qualquer jeito,
d'um jeito qualquer.
Fica o atiço, o rebuliço,
o olhar lisonjeiro.
Vai de quem está na janela,
ou de quem chega primeiro.
Vai do gosto, vai do cheiro.
Vou contar até três,
ficar olhando da sacada,
tomar sorvete de creme
na calçada, só pra ver a rua,
toda minha, toda nua.
As trepadeiras bisbilhoteiras,
torneira aberta, matando a sede
das lavadeiras no gramado.
Pois sou transparente,
olhar de paisagem.
Dias de quietude,
outros de viagens.
E a lua hoje sorriu para mim,
no primeiro dia do ano,
e isso será bom,
salvo ledo engano.
Vou tomar cuidado,
não sair em dias nublados,
nem passar debaixo de escadas,
ter fé na única verdade,
essa sem cor,
livre, mas sincera,
que de vez em quando amarela,
mas é completamente incolor.

(Taciana Valença)


sábado, 30 de dezembro de 2017

VIRADA DO ANO





A barra do vestido indiano que recebera na véspera estava toda molhada. Na verdade ele deveria ter suspeitado que isso iria acontecer, mas achou aquele longuinho amassado de alças a sua cara.

Olhava de longe enquanto ela brincava com as ondas que lambiam seus pés. Com um sorriso largo correu para seus braços, rindo da bermuda branca dobrada sobre o joelho.

Carinhosamente a colocou no colo, deitando-a sobre a areia. A praia estava praticamente deserta, a festa de final de ano na casa do melhor amigo estava perfeita. Casa de praia longe da cidade, só amigos íntimos e a mulher da sua vida. O que mais poderia querer?

Os beijos longos, o vento, as risadas e uma paradinha para conversa séria: o futuro deles, juntos, e o mais breve possível. Não aguentaria viver assim por mais tempo.

Os olhos lacrimejavam quando uma mão o tocou nos ombros. Era a esposa trazendo-o de volta.
- O que houve?

- Nada, deve ser a época, sempre me emociona.

Ela sabia disso. Desde que casara que a noite de Reveillon era assim. Ele um pouco ausente, parecendo longe. No fundo ela sabia o porquê.

Eram noites tristes, marcadas por uma dor que nunca passou, o adeus da mulher que mais amou na vida e junto com ela o futuro perfeito, os sonhos e o lar que planejaram e no qual jamais puseram os pés.

(Taciana Valença)


## 2018 ##



Mantra para 2018:

Menos poesia e mais realidade,
menos romantismo,
menos sonhos,
mais objetividade.

Menos correntes,
mais liberdade!

Taciana Valença

domingo, 10 de dezembro de 2017

XEQUE-MATE



Tarde de chá,
mate ou morra.
Fim da masmorra.
Pôr em xeque.
Fuja, cubra,
não ultrapasse, capture.
Coroa imponente, meu rei,
mas sou rainha,
dona do movimento.
Livre-se do ataque,
sessenta e quatro casas
e meu nascimento,
tenho tempo.
Sem afogamento nem empate.
Xeque-mate!


segunda-feira, 27 de novembro de 2017

PARTINDO



Aos poucos as mãos se soltaram. Os dedos que ainda resistiam, segurando pelas pontas suadas já não davam conta. Era hora de ir, pensou. Seguir estrada, sem olhar para trás. 
As costas das mãos molhadas tentavam em vão enxugar as lágrimas que embaçavam o caminho. Lembrou do amor, do carinho, das preocupações, da amizade. Tudo jogado para debaixo do tapete, feito história em quadrinhos que termina num grande FIM.
Ainda parecia sentir o cheiro do café que nem mesmo chegou a tomar e  da rosa fresca que enfeitava a garrafa azul em cima da mesa na hora do jantar, dando um clima romântico e rústico.  Nenhum aceno, nenhuma emoção.
Por certo o jardim sentirá sua falta. Os lençóis da cama perderão seu cheiro, dando espaço a cheiros mais intensos. 
Não teve coragem de se virar e olhar. Esperou dobrar a BR para não correr risco de querer voltar e dizer que era tudo um grande engano. Mas não, não faria isso, não outra vez. Não era engano. Nada era igual e ela sabia que tinha algo errado. Cansou de ser jarro, pedra ou tapete. Cansou de compor o ambiente e por certo ele cansara do objeto. Deixou cair algumas folhas, marcando o caminho. Mas o vento forte levou, talvez junto com seu coração. Estava solta, leve, triste, vazia.



sexta-feira, 17 de novembro de 2017

MANDACARU



Verde Mandacaru, 
braços pra cima
rendem-se ao sol 
em pano azul.

Verde mandacaru,
mãos ao alto!
Pois vim do asfalto
em busca de tu.

Verde mandacaru,
forte e resistente,
força presente num povo
que não se faz descrente.

Mandacaru cultura,
exemplo de bravura,
segue acreditando,
enquanto sol brilhando.

Nuvens se formam 
num regar esperado
dá um conforto arretado
mas a chuva não vem.

E enquanto não chega
a gente peleja
mas os pontos não entrega
a seu ninguém!

(Taciana Valença)


domingo, 12 de novembro de 2017

## A ROSA QUE CARREGO ##




Hoje trago pra você a rosa
que habita em mim
e que carrego no peito,
que dorme e acorda em meu leito.

Trago para você a rosa
que colhi menina
apenas pelo vermelho
que me fascina.
Trago a rosa que recebi
na primeira menstruação,
era uma boba
com uma rosa na mão.
Trago pra você a rosa
que enfeitou a mesa
nos meus 15 anos,
entre encantos e sonhos juvenis.
Trago a rosa que decorou
o altar no meu casamento,
com todos os encantos
do momento.
Trago as rosas dos dois ramalhetes
que recebi quando amamentei meus filhos,
d'um amor indefinido e sem limites
de único brilho.
Trago também a rosa triste,
que não joguei no túmulo do meu pai
achando que assim o traria de volta.
Mas nunca mais vi seu sorriso.
Trago a rosa da indignação
pelo sofrimento da humanidade,
pelas crueldades e pela dor
da nossa incapacidade.
Mas trago enfim, a rosa
que daria a cada fiel amigo,
esses grandes abrigos,
na caminhada pela vida.
(Taciana Valença)

terça-feira, 7 de novembro de 2017

## VITRIFICADA ##



Intensamente rubra,
ardente,
sob luz emprestada do sol.

Paiol de versos,
cacos
largados nos confins.

Frios olhos,
feito de noite emprestada.
Poema sem passagem,

sem passe,
sem parceiro.
Nenhuma faísca.

Apenas murmúrio
d'm verso perdido.
Pedra poesia. Vitrificada.


EU MORO NUM VERSO (TACIANA VALENÇA)