sábado, 28 de dezembro de 2013

LÁGRIMA


poderia ter vindo do céu

a molhar meu rosto

enquanto andava num parque

e saboreava seu gosto...




ou quem sabe d'um rio

onde num alumbramento momentâneo

mergulharia sem roupas

esquecendo do frio




mas também não vinha do mar

apesar do gosto salgado

porque se viesse

me daria melhor recado




mas dos meus olhos escorria

vindo salgar minha boca

como sala escura e vazia

denunciando uma tristeza rota



(Taciana Valença)

CAMALEOA



Alma esta
Q'inda molhada
De chuva incessante
Adentra na relva
Num verde vibrante
Que rola e  ama
Confunde-se com a grama
Levantando-se azul
Num mar profundo
E deita-se n' areia
Na cor de seu mundo...
Adormecendo vermelha
Ah! Sonhos da paixão
Amarelando de  medo
Dos seus próprios desejos....
Oh! Inquieta alma
De arco íris intensos
Mutantes cores
São teus pensamentos
Que cor tem agora
Teu novo intento?

(Taciana Valença)

DETALHES


 
ater-se aos detalhes
é um pouco ter
o que ninguém mais tem
e saber disso a felicidade
tirar disso um sorrir
uma satisfação,
que ninguém sente, nem sabe,
nem mesmo entende...
ater-se aos detalhes
é sentir a alma de alguém
enquanto fala e pensa
que sua atenção está nas palavras,
palavras jamais dirão nada
jamais serão precisas como o sentir
ater-se aos detalhes,
deixar-se ir, além, muito além....
 
(Taciana Valença)
 


domingo, 22 de dezembro de 2013

ADORNOS

 
Estou cansada dos adornos
Dos enfeites que escondem a alma,
Dessa minha calma,
Das palavras vazias, das vaidades,
Dos sorrisos contidos ou vazios...
Estou cansada da falta de essência,
Dessa inconsistência, da coletiva demência,
Disfarçada de ousadia,
Dos dias que se repetem -
Sem a plenitude do que vale à pena
Do vazio dos poemas,
Dos amostramentos sem sentimentos,
Dos olhos sem brilho -
Da vida opaca,
De tantos que se dizem inteligentes
E não passam de babacas!
 
(Taciana Valença)
 

QUEM SOU

Não me conhecerás, nem mesmo em mil anos,
Resguardo sombras de mim que nem mesmo eu posso entender
No entanto posso saber quem és num único olhar
E fazer do meu coração aconchego para tua alma,
Sempre bem vinda, ou mesmo ignorar tua existên
cia
Para o resto da minha vida...
Não, não sou má, apenas talvez, bem seletiva
E isso é tão natural em mim
Talvez essas montanhas de riscos que não me arrisco,
Façam parte dessas sombras, que não permitem
Que eu seja vista por inteiro, pois há coisas que eu sei
Mas que não cabe a mais ninguém saber
Às vezes conto firmemente com meu lado criança...
(que pode até parecer inocente),
Para sorrir da hipocrisia da humanidade,
Caso contrário excederá em mim um peso desnecessário
Sou tão intensa quanto tímida,
Há em mim curiosidades infantis e lágrimas senis,
Quantas lucidezes senti em meio a pessoas que parecem sempre embriagadas, mesmo sem bebida...
Como num filme, apenas observo, concluo,
E não tendo mais nada a fazer, relevo...
Pobres, espíritos pequenos, que se refastelam,
Lambuzam-se com pequenas misérias disfarçadas de diamantes
Talvez eu seja mesmo esse mistério,
Algo que nem mesmo decifro, mas o que importa?
Quem, em sã consciência tem a ousadia de dizer que pode decifrar algo
Numa vida que surgiu, ninguém sabe onde, quando e nem mesmo por que
Sou essa linha, contínua, com altos, baixos e sustos inevitáveis
Pesquisadora de olhares e condutas, que divertem e assustam
E nesse novelo todo fico imaginando, o que a humanidade busca,
Até onde quer chegar, nesse absolutismo cego,
Afastando o matagal da sensibilidade,
Abrindo caminhos a um mundo de concreto,
Onde suas próprias cabeças sentirão o impacto
Rachando, rachando, rachando.....
Sem volta, assisto os erros, dos falsos acertos!

(Taciana Valença)

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

ESCRÍNIO


Perambulo noite adentro,
No peito esse ermo -
Ecoando perguntas,
Driblando respostas,
Instáveis espasmos de loucuras,
Sobre o peso da mala,
Que de tão cheia já não carrego,
E ali, na solidão do que me coube ser
Cascavilho, mexo, vejo, rejevo,
Tantos são os pesos...
 E eu, que queria apenas uma mochila,
E um caminho... tão simples
Repleto apenas do que preenche,
Sento-me  e sinto-me...
Na tentativa de solver
O que não se dissolve,
Pássaros avisam o amanhecer -
Recolho-me, no recôndito de mim
A mala, esquecida no canto
Espera seu destino,
Olho para ela e vejo
Um escrínio
 
(Taciana Valença)
 
 
 
 
 
 

MEU LUGAR

 
Sou dessa terra que me despe
Não mais que me cobre -
E mesmo que me desdobre
Serei eu, sempre o grão -
Dessa terra, que me cobre

(Taciana Valença)

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

DISFARCE

DISFARCE

 No garrancho Lilás morava uma personalidade fascinante.
Morava? Fingia que morava? Seria bruxa sob toldo colorido?
Fascinante... faceira...facínora!
A cor deslumbrante sobre o caráter repugnante,...

Um garrancho de ser, de gélidos poemas
Uma bela tangerina cheirando a podre...
- Cascas... olhos de pedra que petrificam,
Casa de fim de rua d’espantoso silêncio
Gritos em noite de lua,
Homens que gemiam seus lamentos
Bruxa! Olhos de ametista –
Vingativa, vigarista!
Uma xícara de chá, um gargalhar!
Salto de delicada nobreza desliza no asfalto –
Musa sem dono de pele de seda
Dona dama de pura delicadeza...
Almas cortadas pelo deslumbre , pela destreza
Volta à casa da rua sem fim, do fim da rua –
Prenhe dos gostos, das bocas -
Perigo eterno – estopim

(Taciana Valença)

domingo, 15 de dezembro de 2013

Posso esperar...



Fala pra vida que eu posso esperar -
Já esperei tanto,
Sem que nem mesmo soubesse que estava esperando,
Haverá sempre um abrigo, um sonho, um trabalho
E um amigo....
Fala pra vida que posso esperar,...
O tanto que ela precisar...

(Taciana Valença)
 

Sem lamentos...


Nem muros, nem lamentos
Nem mesmo onde encostar
Desarmar a rede, encher o cantil,
Correr então a mais de mil
Para que a vida não me pegue
E que eu nem mesmo chegue...

E se chegar, nem reconheça
O ser estranho que me habita
Sem tempo para perplexidades,
Guardo lampejos que num piscar -
Se foi, nem mais vejo...
Pois o abismo é sem fim
Repleto de loucuras de mim
Morrendo numa piegas sensatez -
Em breve estarei extinta
Sem casa para voltar,
Nem cama para dormir
Talvez durma longos anos
E nem mais veja o amanhecer
Pois derradeiros momentos
São todos que se vão -
Assim como a vida
Que não volta nunca mais...
Serei a estátua do enigma
Enigma de mim mesma
E no soprar o vento
Serei vapor, d'um calor que se foi,
E quando tudo parecer desarrumar-se
A esperança flutuará,
Soprando, arrumando lugar...
- quem sabe não amanheça,
Pois que dores não deveriam acordar
Bocejando ressacas de vida,
Dormiriam profundamente,
Para todo sempre, e acordaria
Apenas num sopro, de poesia
Quando o sol aparecer
Resmungarei perdas e vislumbrarei caminhos,
Sonhos, risos e ninhos,
A vida que fecunda é a mesma que mata,
Mas que também alivia -
Como canto de passarinho....

(Taciana Valença)
Recordando....

Farda nova, colégio novo, novos amigos, novo professores...
Tanto a reparar, tanto a descobrir. O colégio era enorme, lindo.
Mas logo no primeiro dia algo maior me encantou (maior?). ...
Um besourinho vermelho com bolinhas pretas. Lindo. Estavam em tantas folhas.
Fiquei impressionada com a delicadeza. Parecia que as bolinhas tinham sido pintadas de hidrocor por mãos bem certeiras!
Antes de entrar eu parava e colocava uma em minha mão. Que mania de questionar!
Mas ela era perfeita! Tão linda, tão pequena. O que fazia o dia todo? Teria vindo ao mundo apenas para silenciosamente encantar? Quantos a percebiam? O que comiam?
Um dia coloquei uma no meu estojo. Quando entrei na sala, logo me arrependi.
Claro que ela iria morrer! Contei os segundos para a aula terminar e meu assassinato não se concluir. Foi com alívio que ouvi tocar. Corri e a coloquei na primeira folha que vi.
Parecia ter voltado a respirar com ela. O lugar dela era ali, mesmo que poucos a vissem, mesmo que nada falasse, mesmo que nem parecesse respirar.
Assim comecei a prestar atenção às coisas que ninguém percebe, que ninguém vê e que ninguém se importa. E descobri que são as mais belas e perfeitas.

(Taciana Valença)

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

TEMPO CARMIM

 
Fere,
ao mesmo tempo destila,
exalando doce olor
- febre - suor frio,
línguas, sabor...
suaves os dedos
dedilhando doçuras,
poesias obscuras  -
bocas, hálitos
calientes
largam-se enfim
poço fundo d'emoções
num tempo carmim
 
(Taciana Valença)
 


terça-feira, 10 de dezembro de 2013

FÊNIX

 
 
ressurjo enfim,
do tempo onde há sempre o que me falta,
em abundância -
nessa falta de ar onde só há suspiros,
entre tantas coisas não acho o que procuro,
mas... o que seria mesmo?
a procura me fez esquecer o objetivo,
num cansaço, num desabo, num abandono,
entrego-me ao sono,
 imensidão negra do desconhecido
envolta em amarela nuvem,
acordo desse tempo,
o sorriso ofusca o lamento
me reinvento.
 
(Taciana Valença)
 
 
 
 


OLHAR...

 
voltarei a distrair-me...
qual tantas e tantas vezes,
- olharei para trás,
descansando pelo caminho
enquanto seguem à frente,
que importa?
desviarei caminhos e olhares,
dar-me-ei ao luxo d'algumas vontades,
pois antes tarde,
nem mesmo sei quantos olhares me restam
quantos dias e tardes de sol
sentirei esquentar a minha pele
não, não deixarei que me levem
e que de mim levem o que sou
ou o que me resta
sim, voltarei a distrair-me
ofuscada pelo que se esconde
mas não de mim!
Antes assim.
 
(Taciana Valença)
 

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Pois é, eu poderia ter escrito isso, mas ela o fez por mim.



 "O meu mundo não é como o dos outros, quero demais, exijo demais, há em mim uma sede de infinito, uma angústia constante que eu nem mesmo compreendo, ...pois estou longe de ser uma pessimista; sou antes uma exaltada, com uma alma intensa, violenta, atormentada, uma alma que não se sente bem onde está, que tem saudades...sei lá de quê!"
- Florbela Espanca, in "Carta nº 147".